segunda-feira, 14 de julho de 2014

Aurora: Capítulo 24 - Família


AURORA
CAPÍTULO 24 - FAMÍLIA

 - Deixa que eu tento. - Pediu Dalan, tomando distância. Quase toda a Aurora estava no quintal, procurando abrir o que parecia um porta emperrada. Wieder e Koga saíram do caminho, dando espaço para que o rapaz corresse e desferisse uma ombrada na porta. No entanto, ela dessa vez se abriu com facilidade e o garoto acabou atravessando-a, caindo com o rosto no chão. Ficou alguns segundos parado, com a cara afundada na madeira, enquanto que os companheiros adentravam a sede escura.

 - Meu herói. - Zombou Amanda, dando-lhe um tapinha na cabeça. Lyra por sua vez avançou na escuridão, procurando o caminho até a entrada da guilda.

 - Senhora Stella? Sasha? - Perguntou, estranhando o breu e o silêncio que se mantinha ali. Eles caminharam e entraram no saguão, ainda muito escuro para saber o que havia acontecido. Dominic se dirigiu até as janelas enquanto que os garotos comentavam sobre o enorme breu que havia se instalado ali. Foi apenas quando o homem abriu as cortinas, deixando a luz da lua entrar, que eles perceberam o caos.

 - O que aconteceu aqui? - Koga foi o primeiro a perguntar. Metades das mesas estavam derrubadas, havia uma pequena cratera na parede perto da porta e um líquido vermelho se espalhava por todo o piso. Marcus se ajoelhou perto do balcão, molhando dois dedos no fluído e os aproximando do rosto. Confirmou o pior. Era sangue. Lyra olhou para o segundo andar, percebendo o corrimão destruído.

 - Senhora Stella? - Gritou ela, se dirigindo às escadas. No entanto, olhou para as mesas viradas e percebendo Sophie encarando algo no chão, com a mão no peito e os olhos arregalados de pavor. - O que aconteceu? - Perguntou alarmada, caminhando em sua direção. Ficou ao lado dela e olhou para baixo, também congelando por alguns segundos. - SASHA! 

 A garota estava caída com o rosto para baixo, envolta em uma poça de sangue. Lyra se ajoelhou imediatamente ao lado dela enquanto que o restante da guilda se aproximava. Amanda ofegou e pôs as mãos na boca, enquanto que Julie segurava com força a mão de Koga. Marcus correu e também se ajoelhou ao lado de Sasha, percebendo seu braço quebrado e o enorme corte nas costelas.

 - Alguém pegue o kit médico... - Balbuciou a garota de cabelos roxos, ainda incapaz de compreender o que havia acontecido. Ela tremia, temerosa de virar o rosto de Sasha.

 - E-e-eu vou! - Disse Sophie, a primeira a se recuperar do estupor. Ela correu e tropeçou através das mesas caídas na direção de uma porta que ficava abaixo do segundo lance de escadas, ao lado do quadro de missões. Adentrou o aposento, o almoxarifado médico da guilda, local onde a senhora Stella guardava os primeiros-socorros. Era relativamente grande, com prateleiras vazias ao redor das paredes. Puxou um pacote com força do armário ao seu lado, derrubando os outros potes e pacotes que ali se aglomeravam. Levou o kit até Lyra, que o abriu desajeitada. Uma série de produtos caíram no chão, rolando no sangue, mas retirou o que precisava. Segurou um pano verde e mal-cheiroso na mão direita e o pressionou no ferimento das costelas, procurando estancar o sangramento. Para a surpresa de todos, Sasha reagiu.

 - Ngh... - Grunhiu ela, tentando se virar. Marcus a ajudou, colocando-a calmamente de costas no chão. Seu rosto estava inchado, encharcado de vermelho e com o nariz partido, mas os olhos estavam semi-abertos. A garota levou a mão trêmula até onde Lyra fazia a compressa, tentando puxá-la.

 - Eu sei que dói, querida, mas tente descansar. - Disse a outra, com uma expressão de sofrimento. - Se tentar resistir ao sonífero desse medicamento, as coisas só vão ficar piores. - Sasha, no entanto, não desistia. Ela tateou meio cega o rosto da companheira, arfando com força. Segurou sua face, manchando-a com o próprio sangue.

 - Missões do prefeito... - Começou, tossindo com força em seguida. Sua boca se encheu do sangue que saía e Sophie tapou os olhos, gemendo baixinho. - Estavam nos enganando... encapuzados... sequestraram minha mãe... precisamos... - A exaustão e o remédio finalmente a tomaram, e ela desmaiou. Lyra evitou ao máximo perder o controle, mantendo a compressa com a mão direita enquanto que buscava novos panos no pacote com a esquerda.

 - Precisamos garantir que ela possa ser transportada para Tinyanga. - Ela entregou os medicamentos a Marcus, que os aplicou nas diversas feridas enquanto que a outra esquadrinhava o corpo de Sasha. - O braço tem que ser imobilizado, e o corte nas costelas deve ser estancado. - Tateou cuidadosamente o abdômen extremamente ferido da garota, notando as costelas quebradas. - E temos que enfaixar isso aqui.

 - E depois? - Perguntou Koga, olhando alarmado para os companheiros. - Sasha acabou de dizer que a senhora Stella foi sequestrada! Precisamos ir salvá-la!

 - Nossa prioridade é aqui. - Disse Marcus rispidamente, fazendo uma compressa delicada no nariz da garota. - Só que depois que a transportarmos para a Estrada Verde... - Ele encarou o restante da guilda, com um brilho em seu olhar. - Vamos acabar com quem tenha feito isso.

 - As missões do prefeito... - Começou Dalan, com a mão no queixo. Pensou por alguns segundos até que sua mente se iluminou, fornecendo a resposta. - Acho que tem algo a ver com as áreas que fizemos as missões para Visandre.

 - E encontraríamos quem quer que tenha... feito isso... lá? - Perguntou Julie, largando Koga e cruzando os braços em dúvida. 

 - É a nossa única pista. - Admitiu o garoto, olhando para Sasha. - Seja quem for, veio para cá e nos atacou. Não quero esperar que apareçam aqui novamente. Prefiro reagir.

 - Bem, para mim é o suficiente para um plano. - Disse Wieder, esfregando os dedos nos olhos. - Nos dividimos em grupos e verificamos todos os territórios que cumprimos missão. A Torre de Marfim, Thomas Galvan, Wildest... - Enunciou ele, enumerando as áreas com os dedos. - Deve haver alguma coisa lá. Se dermos sorte, ainda encontraremos Stella. Nos pediriam para esvaziar aqueles lugares, não foi? 

 - E alguém tem que levar Sasha a um médico profissional. - Sugeriu Amanda, com o rosto retorcido de sofrimento pela garota. Lyra ficou em silêncio, ajoelhada no sangue.

 - Sophie... - Começou ela, sem olhar para cima. - Você pode fazer isso por mim? Levá-la para Tinyanga?

 - P-posso mas... - Respondeu a garota, um pouco confusa. - E você?

 - N atacaram em nossa própria casa. - Grunhiu Lyra, ainda sem levantar a cabeça. - Em nosso próprio saguão. Sequestraram a nossa líder debaixo de nossos narizes. Do meu nariz. - Admitiu ela, trêmula. - Eu deveria estar aqui no balcão quando eles atacaram. Deveria ter sido a primeira a confrontarem. Para retribuir isso... - Ela ergueu o queixo, com os olhos marejados e a mandíbula firme. - Eu vou ser a primeira a acabar com eles.

 Dalan olhou para os outros, procurando alguma objeção àquilo. Nada. Fechou os olhos, suspirou fundo e cruzou os braços, pensando em como prosseguirem a partir dali. - Você vai com Amanda para Wildest então. - Pediu o garoto, se virando para o restante dos companheiros. - Wieder e Dominic seguem para a Torre de Marfim, enquanto que Julie e Marcus verificam a Garganta Cortada. Koga vem comigo para Thomas Galvan. - As duplas se entreolharam e acenaram positivamente com a cabeça, cientes de seus objetivos. 

 - Vocês já podem ir se quiserem. - Pediu Lyra, trocando o pano verde que pressionava nas costelas de Sasha. - Amanda e Sophie podem me ajudar a tratar disso aqui. É melhor que sejamos os mais rápidos possíveis.  - Marcus concordou e se levantou, dando uma última olhada para a garota caída enquanto que Sophie tomava seu lugar. O restante dos membros da Aurora se dirigiu até as portas duplas, saindo para a chuva que começava a cair. Ainda nem eram dez da noite, mas ninguém ali se sentia à vontade de esperar. Sua líder havia sido sequestrada, sua companheira quase morta e o orgulho da guilda ferido. Agora era a hora do contra-ataque.

 Enquanto isso, as garotas tentavam estabilizar a situação da filha de Stella. O processo durou quase duas horas, com elas enfaixando costelas, estancando cortes e imobilizando o braço quebrado. Tudo para que a garota conseguisse aguentar a viagem até Tinyanga, onde receberia os cuidados adequados.

 Sophie estava extremamente quieta durante o processo, envolta em seus próprios pensamentos. A condição de Sasha era terrível, e supostamente ela era a mais forte da guilda. Um peso gélido desceu por seu esôfago enquanto se lembrava dos companheiros que haviam saído em busca de confronto. Como conseguiriam vencer?

 Estavam quase terminando quando alguém bateu na porta. Lyra se levantou, arqueando as costas. - Eu atendo. - Disse ela para as companheiras, um pouco extasiada pelas horas de trabalho duro. Estava tão cansada que nem sequer deu o trabalho de perguntar quem estaria querendo entrar na Aurora quase meia-noite.

 Foi apenas quando abriu as portas que se tocou do que estava acontecendo. Viu brevemente uma mulher curvilínea e encapuzada à sua frente, com um simples vestido azul por debaixo da capa, antes de um brilho verde a jogar para longe. A balconista da Aurora foi arremessada de costas, voando o saguão inteiro antes de cair no corredor escuro. - LYRA! - Gritou Amanda, se levantando em um instante enquanto que Sophie protegia Sasha.

 A invasora adentrou a sede da guilda, recolhendo calmamente o capuz. Era uma elfa de cabelos longos e escuros, com uma expressão de completa indiferença. Ela olhou para os lados com calma, percebendo as três membras da Aurora no ninho de mesas caídas. - Oh. - Disse, se aproximando. - Ela morreu?

 - Quem é você? - Disparou Amanda, se pondo entre ela e Sasha.

 - Veja, eu esperava que você respondesse a minha pergunta primeiro. - A elfa olhou para o lado, se calando por alguns instantes. - Só que acho que faltei em minha educação. Deveria me apresentar quando entrei. Meu nome é Alana. - Ela segurou as pontas da longa capa e dobrou os joelhos graciosamente. - Vim aqui mais cedo, mas não encontrei nenhum de vocês. Ou ao menos, quase nenhum. - Ela se inclinou um pouco, observando a garota caída.

 - Desgraçada. - Grunhiu a garota de cabelos castanhos, disparando na direção da invasora. Alana não demonstrou nenhuma reação, mas quando Amanda estava prestes a socá-la um rastro de energia verde se materializou brilhantemente, traçando um caminho horizontal para acertá-la no estômago. Ela não soltou nenhum som, mas foi atirada na direção da escada com uma força incrível, quebrando o corrimão, batendo nos degraus e caindo com o rosto no chão. Não se levantou.

 - AMANDA! - Gritou Sophie, mas no mesmo instante a invasora se pôs à sua frente, cobrindo-a com sua sombra. A garota olhou trêmula para cima, encarando olhos sem emoção.

 - Sabe qual é a propriedade da energia verde? - Perguntou a elfa. A membro da Aurora engoliu em seco. Aquilo era um teste? Uma armadilha? Não respondeu, mas cobriu lentamente o corpo de Sasha com o braço esquerdo. - Não, não, não... - Disse Alana, balançando a cabeça. - Toda energia manifestada de forma pura no ambiente tem uma propriedade característica, e pode ser explicitada por sua cor. Agora, qual é a propriedade da energia verde? - Repetiu, se abaixando e apoiando os cotovelos nos joelhos.

 - R-r-repulsão. - Respondeu Sophie, tremendo. A invasora por sua vez sorriu de forma fria e encarou Sasha, como se fosse a primeira vez que a tivesse visto ali.

 - Ela contou para vocês do acordo? Sobre vocês trabalharem para nós enquanto mantemos a líder de vocês sob nossa custódia? - Ela encarou a outra, que balançou negativamente a cabeça. - Bem, agora vocês sabem. - A energia novamente brilhou na escuridão do saguão, acertando Sophie no rosto. Ela foi impelida para o alto, caindo lentamente em cima de uma mesa próxima. Alana se levantou, espanando o vestido. Olhou para a garota em frangalhos abaixo de si, indefesa. No entanto, não tinha necessidade de matá-la. Desaad havia a enviado para alertar a Aurora do acordo caso Sasha tivesse falecido. Não havia pedido para se garantir dessa morte, e não viu nenhum motivo para isso. Se dirigiu à porta colocando o capuz de volta, consciente de que sua missão ali havia terminado.

 A sua havia, mas a de outras pessoas estava apenas começando.

 - Vai tão cedo? - Perguntou a voz de Lyra. A invasora olhou para trás, um pouco surpresa. A membra da Aurora estava com seu arco em mãos, apontando uma flecha na direção da elfa. - Tem certeza de que não quer ficar mais um pouco?

 - Não tenho tempo para isso. - Alertou Alana depois de alguns momentos de silêncio, com um quê de irritação passando por suas sobrancelhas. - Preciso ir à Wildest.

 - Wildest? Que coincidência. - Disse a garota com um zombeiro sorriso. - Estávamos indo para lá agora mesmo em busca da nossa líder. - Os olhos da invasora se estreitaram, até então o máximo de emoção que ela havia demonstrado. Lyra deu um passo à frente, saindo do corredor e adentrando o saguão. Olhou rapidamente para a direita, vendo Amanda caída perto da escadaria. - Foi você quem fez aquilo com Sasha?

 - Não. Foi o meu mestre. - Respondeu a elfa.

 - Então vou acabar com ele depois de terminar com você. - A garota de cabelos roxos atirou a flecha, que foi velozmente de encontro ao peito da encapuzada. No entanto, uma parede de energia verde se materializou, protegendo-a do ataque.

 - Você não estava aqui quando falei dos meus poderes, foi? - Perguntou a invasora, jogando a parede de encontro à adversária. Ela foi derrubada no chão mas antes que pudesse se levantar, Alana surgiu e pisou em seu tornozelo. O som dos ossos partidos se propagou pelo aposento, e Lyra gritou. - Hm? Tão fácil? - Perguntou surpresa, retirando o pé. - Você... não é uma Yulliana, né? É apenas uma humana normal. Como esperava que pudesse sobreviver contra mim? - No momento em que se agachava, no entanto, uma imensa lufada de vento a fez cair para trás. No meio de seu movimento algo duro se chocou contra suas costelas, fazendo-a trincar os dentes de dor.

 - Poderia por favor se afastar da minha amiga? - Perguntou Amanda, com o cotovelo nas costas da elfa. Um novo pulso verde começou a se formar abaixo dela, mas a garota segurou a encapuzada pelos braços e conseguiu trazê-la pra perto de si. As duas foram jogadas longe pela energia repulsora, atravessando a parede rachada da sede da Aurora e caindo ao lado do chafariz, rolando e batendo nas pedras rachadas e molhadas pela chuva do piso.

 Alana foi a primeira a se levantar, recolhendo o capuz com impaciência. Ela desferiu um novo ataque que iluminou a noite na praça. A membra da Aurora rolou para o lado, escapando por pouco do golpe que varou a cobertura do chão. Enquanto os pedaços ainda voavam pelo ar a garota usou o vento para jogá-los na direção da adversária, que conjurou uma nova parede para se proteger. A luz esverdeada serviu para fazê-la enxergar Amanda correndo em sua direção, com o punho estendido e rosto enfurecido.

 A invasora jogou a adversária para longe, fazendo-a bater na parede de uma das inúmeras casas vazias que as cercavam. Tentou atacar novamente, mas a garota se abrigou no interior do edifício, se misturando no meio da escuridão. Alana voltou a atacar, desferindo golpe atrás de golpe na fachada da morada, mas não encontrou seu alvo.

 A praça ficou em silêncio. A elfa cobriu sua mão com a energia verde, iluminando uma esfera ao redor de si. Ouviu passos e tentou atacá-los, mas sem sucesso. Rodou o chafariz, procurando a adversária nas janelas escuras ou nos corredores sombrios. Nada.

 De repente sentiu o respingar atrás de si, e varou a fonte com um estouro de repulsão. A água voou para longe junto com as pedras quebradas, mas não havia ninguém ali. Arregalou os olhos, e naquele momento Amanda surgiu detrás dela, jogando-a contra a construção quebrada. Caíram na água, onde a membra da Aurora não se demorou para prender sua cabeça nos destroços da base, socando-a repetidamente em seguida.

 O azul do líquido se misturou com o vermelho do sangue da elfa, alguns instantes antes de se tornar verde e brilhante. Alana conjurou uma nova onda de energia verde, que catapultou a outra para longe. A garota voou pelos ares e se chocou contra a entrada da guilda, caindo a alguns passos de Lyra, que se apoiava no batente com o arco nas mãos.

 A invasora quase não conseguiu se defender, erguendo uma parede bem a tempo para bloquear as flechas da adversária. A balconista da Aurora parou, esperando Amanda se levantar ao seu lado.

 - Pra quê lutar com tanto empenho? - Perguntou a elfa, saindo da fonte completamente encharcada, com o nariz sangrando e as roupas pingando. - Realmente não consigo entender. Não desejo matá-las.

 - Não foi o que pareceu com Sasha. E se a deixaram assim, não pense que iremos ficar de cabeça baixa. Assim como não vamos deixar que fiquem com nossa líder. - Disparou Lyra, retesando a corda do arco novamente. - Aqui nos protegemos. Somos uma família. Algo que pessoas como vocês jamais entenderiam. - Alana naquele momento congelou. Seu rosto se manteve sem emoção, mas os olhos se arregalaram de uma maneira que não parecia possível.

 A membra da Aurora viu aquilo como uma abertura. Atirou uma nova flecha, que surpreendentemente atravessou o braço esquerdo da elfa.

 Pensou em comemorar, mas naquele instante viu o olhar da adversária e sentiu a mesma coisa que Sasha havia sentido durante a luta com Desaad. O medo da morte.

 Percebeu algo brilhar atrás dela, e antes que notasse foi arremessada de encontro à invasora. Alana cessou seu movimento a agarrando bruscamente pelo pescoço, fazendo com que a garota engasgasse e perdesse o ar. - Nunca mais fale sobre isso. - Disse com a voz fria, e movimentou o braço ferido. Amanda, de longe, conseguiu pressentir o que estava vindo e gritou para tentar impedir. Era tarde. A palma da mão da elfa se fechou e penetrou a pele um pouco ao lado do umbigo da adversária, se afundando em seu corpo. Lyra ofegou e vomitou o sangue que também vazava pelo ferimento, manchando as roupas da outra. - Normalmente é preciso mais do que isso para matar um Yulliano. - Grunhiu por entre os dentes, flexionando os dedos lentamente. - Só que você não é uma, é? - Perguntou, retirando a mão em um som asqueroso e largando sua presa no chão.

 - LYRAAAAAAA! - Berrou Amanda, correndo ensandecidamente em sua direção. Da escuridão da Aurora, sem que ela soubesse, emergiram duas feras escamosas que também dispararam ao encontro da invasora. A membra da Aurora apenas viu os borrões verdes antes de entender o que estava acontecendo. Os Recons haviam entrado na luta. - Dalila! Sabre! - Gritou, em uma mistura de alívio e medo.

 Os répteis tentaram atacar Alana, enquanto que Amanda se jogou para proteger Lyra de ser pisoteada ou também atacada. A elfa no entanto, parecia ser o único alvo. Ela bloqueou um ataque pelo seu lado esquerdo com uma parede de repulsão, mas Sabre era tão forte que necessitava de toda a concentração para cuidar dele. Dalila aproveitou e a abocanhou, mordendo toda a região do ombro. A invasora gritou de dor, perdendo a concentração de seus poderes. O Recon macho aproveitou para cortá-la com as garras de seu pé, rasgando todo o lado esquerdo da adversária, que caiu de joelhos.

 Completamente ferida, ela invocou seus poderes mais uma vez, jogando o que restava do chafariz atrás de si em cima dos animais em uma explosão de repulsão. As feras foram jogadas para longe, mas o escopo do golpe não acertou Amanda. Ela manteve em cima de Lyra, cobrindo-a com seu corpo. Alana se levantou, trêmula, encarando as duas membras da Aurora aos seus pés. - Vão para o inferno. - Disse, abrindo a mão esquerda em uma palma novamente.

 Antes que pudesse atacar, sentiu algo puxando seus braços. Tentou se livrar, mas o sangue perdido já havia consumido quase todas as suas forças. Virou a cabeça para trás, vendo uma boina branca pendurada no ar. Olhou arregalada para baixo, procurando o que estava a prendendo. Não viu nada, exceto roupas sem corpo.

 - AMANDA, AGORA! - Gritou Sophie, se materializando com os olhos fechados. A garota levantou a cabeça, observando a cena à sua frente. Grunhiu em fúria e usou seus poderes para aproximar um pedaço partido da fonte para perto de si. Se levantou com o objeto nas mãos, encarando Alana com uma expressão de fúria silenciosa.

 - Nunca mais ataque minha família. - Ao dizer isso, ela usou todas as suas forças para golpear a elfa na face com o reboco do chafariz. A pedra explodiu no rosto dela, quebrando alguns ossos em seu caminho. Sophie a largou e a invasora caiu no chão, derrotada.

 A praça ficou em silêncio por alguns segundos, como se estivesse se recuperando da luta que havia acontecido em seus terrenos. Foi apenas quando um dos Recons se levantou, rugindo, que o feitiço se quebrou.

 - Lyra! - Se alarmou a garota de cabelos loiros, ajoelhando ao lado dela. Amanda se virou para ajudar, mas algo segurou seu tornozelo. Ela olhou para baixo, vendo que Alana ainda a encarava através de seu rosto ensanguentado, mesmo com um dos olhos semi-fechados pelo enorme inchaço na bochecha.

 - Se acha que... - Ela cuspiu um dente quebrado, novamente sem emoção alguma. - ... vão conseguir nos capturar, sabia que é impossível. Somos o... Culto Púrpura. Apenas voltaremos mais... fortes. - Ela largou a garota, encarando o céu estrelado acima delas. - Aoena Ortaris.

 Sua capa se agitou e expandiu, envolvendo todo o seu corpo em uma espécie de invólucro roxo e prateado. Antes que alguém pudesse fazer alguma coisa, ele girou em um redemoinho de linho e sumiu com uma lufada de vento, deixando as três garotas sozinhas na noite escura.

 - O que é isso? Magia? Estamos lidando com magos? - Perguntou Sophie ainda ajoelhada, encarando Amanda com medo no rosto. - Amanda?

 - Sophie, pegue um kit médico no almoxarifado. Depressa. - Pediu a garota, ainda encarando o espaço onde Alana havia sumido. - Precisamos estabilizar Lyra e mandá-la para Tinyanga junto com Sasha ainda hoje. Leve um Recon com você para voltar rápido depois disso.

 - Sim. - Respondeu, se levantando e correndo até a Aurora. No meio do caminho, ela parou e se virou para a companheira, que se ajoelhava ao lado da amiga. - E você, Amanda? Não vai com a gente?

 - Irei ficar aqui na sede. - Disse ela, observando o rosto de Lyra. - Seja o que quer estejamos enfrentando, tenho certeza de que ainda não acabou. - A garota levantou a cabeça e espreitou uma rua vazia, como se esperasse que algo surgisse do meio da escuridão. - Pelo contrário. Acho que está apenas começando.

 Se lembrou dos companheiros que haviam partido, talvez prestes a confrontar os membros do tal Culto Púrpura. Que os deuses os protejam, orou Amanda. Iriam precisar.

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