quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

RN Nuzlocke Y - Capítulo 5: A primeira queda

RECINTO NERD NUZLOCKE - Y - 
CAPÍTULO 5: A PRIMEIRA QUEDA

 - Eu disse que deveríamos ter saído mais rápido da rota 2. - Disse Frog, segurando um pedaço de pão na pata. - Aprendeu agora?

 - Frog, se você falar mais uma palavra, quem vai pro fogo é você. - Reclamou Kari, carrancuda. Era noite, e o grupo estava reunido ao redor de uma fogueira, jantando as sobras do que havia na mochila da treinadora. Kari, Frog e Paola estavam acompanhados por Peter, o Pansage que haviam capturado na floresta, e Bob, um Burmy que havia se juntado à equipe naquele mesmo dia.

 - Nós podíamos ficar uma refeição sem brigar? - Perguntou Paola, mordiscando o pão, irritada. - Só uma vez?

 - Isso mesmo, gente. Um pouco de paz, por favor. - Disse Peter, bocejando. Ele reclinou na tora de madeira onde estava sentado enquanto Kari e Frog trocavam olhares ameaçadores. - Ei, novato! Você não vai comer não? - Ele se dirigia à Bob, que estava um pouco mais afastado, e sua comida, intocada.

 Como se tivesse acabado de sair de um transe, o Burmy se assustou, olhando ao redor. Quando viu o resto da equipe o encarando, ele começou a comer, embora se mantivesse afastado.

 - E então? O que faremos amanhã? - Perguntou Frog, terminando seu prato. - Não temos o suficiente para comer por nem mais um dia. Não pra todo mundo.

 - Teremos que nos adiantar. - Respondeu Kari, limpando a boca com as costas da mão. - Se tivermos sorte, poderemos recolher algumas frutas à beira da estrada.

 - É isso? - Estranhou o Froakie, franzindo a testa. - Em que época do ano você acha que estamos? Acabamos de sair do inverno.

 - Não vejo você dando uma sugestão. Que tal começar a fazer isso, ao invés de reclamar o tempo todo? - Disse a treinadora, ríspida. Paola e Peter se entreolharam, tensos.

 - Q-que tal um p-pequeno jogo? - Disse o Pansage, nervoso, tentando melhorar o clima. - Ou uma conversa saudável? Ou adivinhas? Caramba, adivinhas são... - Naquele momento o pequeno estômago do Pokémon roncou audivelmente, e ele se calou. - Oh, que coisa...

 Naquele momento, Kari ficou sombria. Ela levou o prato para mais perto da fogueira, se levantando em seguida. - Comam a minha parte. Perdi a fome. - Mesmo com os protestos de Paola, ela começou a se afastar para o norte, caminhando com passos firmes. Não parou até chegar a um barranco, de onde fitou o caminho que os aguardava. O céu imensamente estrelado cobria a estrada serpenteante, e um pequeno conjunto de luzes ao longe marcava o destino deles. Santalune.

 Kari se sentou, deixando as pernas ficarem soltas no desfiladeiro. As coisas definitivamente não pareciam promissoras. Mal tinham comida para passar a noite, que dirá o resto da estrada, pensou. Seu estômago vazio se retorceu, embora o motivo fosse muito diferente da fome. A quem queria enganar, se perguntou a garota. Tentou se forçar em uma aventura com um objetivo bastante tênue, e agora três vidas estavam dependendo dela, e a cada segundo os colocava mais em perigo. Burra, burra, burra.

 Envolta em seus próprios pensamentos, não percebeu a chegada de Paola ao seu lado.

 - Kari... você está bem? - Perguntou a Pokémon. A treinadora demorou para responder, com os olhos fixos no horizonte.

 - Eu juro que vamos chegar na cidade sãos e salvos. - Disse ela, sem saber para quem.

 - Nós sabemos. - Kari se virou para a Pidgey. - Ninguém ali duvida de você. Nem mesmo Frog. Digo, ele tem algumas... desavenças em relação ao jeito de liderar, mas se ele ainda não desistiu, é porque realmente te respeita.

 Kari soltou uma risada pelo nariz. - Acho que Frog não desistiu porque ele teria que me matar para conseguir fazer o que quer. E por enquanto isso daria um belo trabalho.

 - Bem, então de qualquer jeito todos estamos presos com você, não? - Riu Paola. - Vamos lá, Kari. A jornada acabou de começar, não adianta ficar depressiva com todos os pequenos obstáculos que encontrarmos. Afinal, temos motivos para sermos Campeões, não é?

 Mesmo com suas ressalvas, Kari se viu obrigada a levantar. Paola tinha razão, se fosse ficar lamentando por cada erro que cometer, nunca chegaria ao final. - E qual é o seu motivo para seguir em frente, Paola? Digo, pra que ser Campeã?

 A Pidgey sorriu, voando até o ombro da treinadora. - É engraçado, mas um pouco vergonhoso. Talvez um dia eu te conte. - A garota seguiu pressionando enquanto andava de volta à fogueira, mas não obteve sucesso. De qualquer forma, o princípio de depressão havia sumido. Por ora.

 No dia seguinte, a equipe começou a descer a rota em direção à cidade de Santalune, ao norte. A estrada possuía diversas curvas e descidas íngremes, portanto Kari não esperava chegar ao seu destino ainda naquele dia. No entanto, suas reservas de comida estavam assustadoramente críticas, e a pressa era fundamental. Assim, eles seguiram com passo apertado, movidos pelo desejo de comida de verdade.

 O sol já estava se pondo no oeste, e o cansaço era plenamente visível neles. Kari tentava liderá-los, mas as pernas já não conseguiam caminhar sem ameaçar desabar.  Estava vestindo uma das duas únicas roupas que Shauna havia lhe dado, uma camisa preta e sem mangas, que se colava em seu corpo magro, e uma saia vermelha, presa perto do umbigo e que descia até um palmo acima dos joelhos. Não era exatamente uma vestimenta que agradasse à garota, mas não havia muita escolha. As outras roupas haviam se rasgado na floresta.

 Estava tão cansada que nem viu a patinadora chegar.

 - Cuidado! - Gritou Paola, mas já era tarde. Uma outra garota veio descendo pelo declive acima, e estava rápida o suficiente para evitar o choque. A Pidgey se jogou para proteger a treinadora, empurrando-a para o lado e a desequilibrando. Kari, exausta, acabou caindo no mato ao lado da encosta, se embrenhando no mato alto. Ela bateu a cabeça com força em uma pedra, e antes de desfalecer sentiu o sangue escorrer pelo ferimento enquanto o corpo rolava. Sem forças, não conseguiu exclamar um som.

 Acabou acordando poucos minutos depois, envolta de grama rasgada e terra revolvida. Se apoiou no cotovelo direito, colocando a mão na cabeça com cuidado, sentindo o sangue ainda úmido na testa. Suas pernas e braços doíam, e o vestido havia rasgado na coxa direita. Mesmo assim a adrenalina a fez levantar, olhando ao redor em busca de sua equipe.

 - Frog? - Gritou, alheia à dor. - Paola? Peter? - Ela girou em torno de si, aguardando uma resposta. O mato era quase de seu tamanho, e a única direção que tinha era o caminho que pelo qual havia caído,

 - Kari? - A voz de Peter conseguiu ser ouvida baixinha, quase que imperceptível. A garota se virou para os lados, tentando identificar de onde vinha. - Kari? - Esquerda. Com certeza. Ela correu, afastando as plantas que teimavam em impedir seu progresso. Conseguiu ver o familiar tom azul de Frog ao longe, e começou a correr mais rápido.

 Quando chegou à clareira, não percebeu que havia parado, nem que havia caído de joelhos. Pois à sua frente, envolta por um círculo composto do resto da equipe, havia o corpo de Paola. A Pidgey estava ligeiramente queimada, mas seus olhos estavam abertos, fitando o vazio.

 - O... o... - Kari não conseguiu completar a frase. Naquele momento uma outra cena brotou em sua mente, onde um Bellsprout jazia morto no chão. Ela levou as mãos à cabeça, e a cena mudou, indo para uma fuga corrida de uma caverna, e ela estava gritando. Gritou também no mundo real, e novamente a cena se alterou, e estava segurando uma Jolteon falecida em seus braços.

 De repente não havia mais nada em sua cabeça, mas ela não se levantou. Agarrou com força a grama, arrancando-a com truculência. Pois, mesmo prometendo que levaria todos de forma sã e salva até Santalune, ela havia mentido. Mesmo sabendo que Paola tinha um motivo para seguir em frente, nunca saberia. Mesmo com todos aparentemente confiando nela, havia cometido um erro.

 E seu erro havia custado uma vida.

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