quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Aurora: Capítulo 7 - Perdidos debaixo da terra

AURORA
CAPÍTULO 7: PERDIDOS DEBAIXO DA TERRA

 Dalan sentiu como se estivesse flutuando, imerso no frio e na tranquilidade. Sua memória parecia ter se apagado, e seus sentidos soavam letárgicos. No entanto, nada disso importava, pois ele estava finalmente descansando. Isso é um alívio, pensou para si mesmo, conseguindo flexionar os músculos de sua mandíbula para, em algum lugar distante, sorrir. Havia paz.

 Quase na beira de sua percepção, sentiu-se levantado pelos ombros. Ah não, pensou, franzindo minimamente a testa. Amanda, por favor, me deixe em paz. Espere, quem é Amanda, perguntou uma outra parte do seu cérebro, a que ainda estava adormecida. Amanda, a pessoa que viemos resgatar, respondeu a voz da parte acordada. Não, não conheço. Deve estar confundindo com alguém. Não, cara, discutiu a outra voz. Amanda, lembra? A garota que testou a nossa paciência durante o dia inteiro? Estávamos com ela até agora, um pouco antes de... cairmos...

 De repente, Dalan abriu os olhos. A queda, o roubo, a prisão, tudo foi voltando retroativamente até ele recobrar por inteiro a consciência. Focou os seus sentidos dispersos, tentando entender o que estava acontecendo ao seu redor, envolto em uma explosão de cores e sensações. Estava sendo puxado pelos ombros, arrastado através da água. A escuridão predominava no lugar, com exceção de um pálido foco de luz atrás do garoto, que iluminava um pouco do lago subterrâneo em que se encontrava.

 Sentiu as costas baterem em uma formação rochosa, e franziu o rosto quando dores latentes começaram a se propagar por todo o corpo. Grunhiu baixinho, e recebeu como resposta um soco no rosto, que por muito pouco não deixou desacordado. 

 - Esse aqui quase acordou. - Disse uma voz aguda, captada ao longe, como se o garoto estivesse debaixo d'água. Masculina, talvez, mas era difícil decifrá-la naquele ambiente. O sangue saía do nariz de Dalan, se misturando com a água fria que cobria seu corpo por inteiro. Ele abriu minimamente os olhos, consciente do perigo de ser descoberto, e espiou a área ao seu redor.

 Haviam aparentemente três humanos, todos homens e vestindo roupas escuras, afastados alguns metros dele e debruçados sobre algo que o rapaz não conseguia enxergar. Duas pequenas lamparinas atrás deles emitiam uma luz branca e trêmula no local, um recanto de caverna banhado por um rio escuro e de correnteza lenta. Havia outra pessoa ali, que continuava a arrastar Dalan através das pedras afiadas e úmidas, levando-o até o grupo.

 - Três reféns. Dois humanos e um anão. É mais do que eu poderia sonhar. - Disse o do meio. O da esquerda riu com voz grossa, mas o da direita se debruçou para frente ainda mais.

 - O que é isso no braço dela? - Ele se mexeu quase que imperceptivelmente. - Isso é... uma Marca? Ela é da uma guilda? - Terminou a frase, alarmado. Se virou para trás, mostrando um rosto com olhos muito pequenos e fundos, encarando a pessoa que carregava Dalan. - Lucius, temos um problema!

 - Deixe-me ver. - Lucius largou o rapaz, fazendo o garoto bater dolorosamente a cabeça nas pedras. Ele afastou os companheiros com truculência, deixando Dalan ver o que estavam observando. Para confirmar seus temores, Amanda e Wieder estavam ali, ambos desacordados e ensopados. O captor de Dalan, um homem alto e de capuz negro, se ajoelhou para mexer no braço da garota. - Parece que é. Não conheço essa guilda, mas tenho certeza de que a Marca é real.

 - O que faremos, Lucius? - Perguntou o homem de olhos pequenos, com seu suor visível na luz pálida das lamparinas. - Não podemos ter uma guilda correndo atras de um membro perdido. - Um de seus companheiros se adiantou, remexendo no anão adormecido.

 - Este aqui não tem Marca. Talvez devamos nos livrar da garota e ficar um refém só. - Disse ele, com sua voz grave e entediada. Dalan não gostou daquela frase, e começou a ficar tenso.

 - Talvez ter um refém de uma guilda seja algo bom. - Disse o terceiro homem, de olhos puxados e nariz adunco. - Pensem comigo: Ela seria obrigada a se manter fora de nossos assuntos enquanto tivermos uma faca na garganta dessa aqui.

 - Você é imbecil, Lonn? - Disparou o homem de voz grossa. - E mais provável que tenhamos nossas cabeças em um poste quando eles nos encontrarem com todo o seu contingente. Sua mãe te deixava cair do berço, anormal?

 - Carl, Lonn, calados. - Disse o homem que estava segurando Dalan com uma voz calma, no instante em que Lonn começava a discutir. Estava claro que ele era o líder daquele grupo, visto que os outros se calaram imediatamente. - Verifiquem o garoto. Ele também pode ser um membro de guilda.

 O humano de olhos puxados se levantou, indo em direção ao garoto. Dalan, já recuperado do desmaio, esperou ate que Lonn estivesse na metade do caminho para socar o chão com a mão esquerda, congelando o terreno entre eles. A adrenalina lhe deu forças para ignorar o cansaço, o frio e as dores, colocando-o novamente na ativa. O captor se desequilibrou e caiu, gritando, chamando a atenção dos outros três.

 - É uma armadilha! - Gritou o líder, puxando uma desacordada Amanda pelo braco. - Sol, precisamos garantir os reféns! Vocês dois, estão liberados para matar! - Dalan se levantou com um salto, pensando em correr ate seus companheiros, mas o homem de voz grossa se colocou em seu caminho, tentando socá-lo. O garoto pulou para trás, desviando do golpe e dando tempo para que Sol, o individuo de olhos pequenos, pegasse uma das lamparinas e corresse, puxando Wieder pelo braço e o arrastando pela caverna. Lucius, ainda segurando Amanda, o acompanhou, deixando Carl e Lonn com Dalan.

 - Baldito. - Resmungou Lonn, se levantando com a mão no rosto. Sangue pingava por entre seus dedos, encharcando os dedos do liquido vermelho. - Eu bou acabar com você. - Ameaçou, com sua voz anasalada pelo ferimento. Ele retirou uma adaga do bolso da calca, se adiantando para atacar seu alvo. O garoto novamente pulou para trás, evitando o golpe, e encarando os dois adversários a sua frente. Seu coração batia com velocidade, enquanto o resto de seu corpo adotava uma postura de luta, levantando os bracos a frente do peito com os punhos fechados e colocando uma perna atras da outra, preparado para qualquer movimento. A adaga fez seu cérebro reconhecer o perigo, colocando-o em uma situação em que nunca esteve: uma luta por sua vida.

 Carl se adiantou, correndo para lhe dar um soco. Dalan apontou a palma para o chão rapidamente, congelando as pedras no caminho do adversário. Ele tropeçou e começou a cair, gritando. Antes do rosto do homem atingir o chão, ele encontrou o pé do garoto, chutando-o com forca. Sangue e dente voaram, e o membro da Aurora sentiu o joelho doer pelo golpe. A queda havia sido muito pior do que esperava. Isso não era bom.

 De repente Lonn pulou em cima dele, tentando enfiar a adaga em seu peito. Imbecis, pensou Dalan, lutando para segurar a arma. Ele mesmo não havia prestado atenção no inimigo, e o adversário poderia tê-lo matado se quisesse. A ponta da lâmina arranhou a esquerda de seu ombro, produzindo um filete de sangue. O garoto agarrou o braco do rival e o puxou para frente, jogando-o no chão com as costas para baixo. No entanto, ele rapidamente se levantou, assim como Carl. Saco, pensou o rapaz, adotando uma postura defensiva, com os punhos cerrados protegendo o peito. O que faria agora?

 Naquele mesmo instante, como se os deuses tivessem ouvido seus pensamentos, um vulto negro e azul se adiantou por trás dos homens. Antes que ele fizesse alguma coisa, uma voz feminina ecoou pela caverna, familiar para os ouvidos de Dalan. - Escolheram a guilda errada, rapazes. - Em seguida, o vultou os socou na região da coluna. Eles caíram de joelhos, e a mente do rapaz correu para aproveitar o movimento. Ele se adiantou e bateu a cabeça dos dois com força, soltando um som surdo. Carl e Lonn desabaram, desmaiados.

 Dalan, no entanto, imediatamente se virou para o vulto, que agora tomava forma. Era uma garota de cabelos azuis bem claros e maria-chiquinha, vestindo um colante azul e negro. Era impossível não reconhecê-la, mesmo se Dalan não tivesse lutado contra ela quando entrou na guilda. Sasha. O garoto levantou as sobrancelhas e esboçou um sorriso, ao mesmo tempo surpreso, cansado e satisfeito.

 - Sasha? - Começou ele, se aproximando da garota. - Que --

 - O que está fazendo aqui? - Interrompeu ela, rispidamente. Encarou o garoto com um olhar desconfiado e reprovador, franzindo o cenho. - Afastado de Helleon e sozinho? Já abandonou da guilda?

 - Não! - Se apressou em dizer o garoto, levantando as mãos. - Não. Eu vim pra procurar Amanda! Sua mãe me --

 - Amanda? - Interrompeu novamente Sasha, se aproximando do rapaz. A garota olhou de relance para Carl e Lonn, que continuavam desacordados. - Ela estava por aqui? Em Vertreit?

 - Bem, sim...

 - Onde ela está? - À essa altura, Dalan já deveria estar acostumado às interrupções, mas ainda mordeu a língua para não responder a garota.

 - Ela... foi capturada. - Admitiu, encarando a escuridão que havia acobertado os raptores.

 - Você a deixou ser capturada? - A expressão de Sasha demonstrava o agudo aumento de repreensão dela. A garota se aproximou de Dalan, ficando frente a frente com o garoto. Mesmo sendo mais alto, o rapaz engoliu em seco ao ser encarado por aqueles severos olhos azuis. - Deveria ter ficado com ela! Nós da Aurora protegemos uns aos outros! - Disse ela por entre os dentes. - Isso é tão difícil de entender?

 - Não, eu... - Gaguejou Dalan, ficando nervoso. Para alguém que tinha tanta dificuldade em deixar outras pessoas entrarem na guilda, Sasha mudava completamente a atitude com membros depois que eles entravam na organização. - Não foi culpa minha! Amanda que havia corrido pelos corredores no meio da passagem dos vermes da montanha! Não havia como eu...

 Desta vez, Sasha o interrompeu de forma diferente, colocando os dedos médio e anular na boca do garoto para impedi-lo de falar. - Nunca culpe os outros pelos seus próprios erros. Se você tinha a capacidade de fazer algo diferente, a culpa é sua também. Ou vai me dizer que não havia como? - Ela recolheu a mão e o encarou sem piscar, e Dalan desviou o olhar, constrangido. Realmente, se ele tivesse vindo com um bom plano no início, ele e Amanda não teriam se separado, e nada disso teria acontecido. Sentiu o rosto ficar vermelho, e respirou fundo antes de responder.

 - Não.

 - Então ótimo. - Ela se afastou de forma brusca, se virando para a direção que o garoto havia olhado antes. - Vou lá salvá-la. Fique aqui cuidando desses dois até eu voltar.

 - E-espere! - Disse Dalan, mas Sasha o ignorou. Ela andou até a lamparina branca e tombada que ainda oferecia a única luz ao ambiente, abrindo-a para vasculhar seu interior. - Eu vou com você.

 - Não, não vai. - Comentou ela, com firmeza na voz. Enfiou a mão no interior da lamparina, pegando um punhado de pó branco e brilhante, conhecido como extrato de Lune. - Você vai ficar aqui e certificar que esses dois não vão correr atrás dos chefes. - Ela despejou o pó no chão, fornecendo uma mínima esfera de luz extra. - Além disso, trabalho melhor sozinha.

 - Mas eu preciso! - O garoto se adiantou e ficou na frente dela. - Você mesma disse que eu tenho culpa no fato dela ter sido sequestrada! Se isso é realmente verdade, eu tenho que resgatá-la! - Ele a encarou, prendendo a respiração. Conseguia entender o ponto da garota à sua frente, ele realmente tinha culpa. E era por isso mesmo que não aguentaria ficar ali, aguardando pacientemente enquanto outros resolviam seus erros.

 Depois de algum tempo em que ficou pensativa, Sasha revirou os olhos e suspirou. - Bem, se quer tanto ser útil para a guilda, quem sou eu para reclamar. - Ela o encarou, novamente séria, e apontou dois dedos para Dalan. - Apenas duas regras, e ouça bem: Primeiro, fique calado. Segundo, faça o que eu mandar. Consegue entender?

 - C-consigo. - Era impressionante o fato de Sasha conseguir acuá-lo, mesmo cansado daquela forma. A garota olhou de relance para os dois bandidos que ainda se encontravam desacordados no chão, e espalhou o pó de Lune com o pé direito. - Eles devem ficar perdidos por algum tempo. Vamos rápido. - Em seguida, andou em direção à escuridão, pisando forte e segurando a lamparina à frente do rosto. Dalan olhou mais uma vez para Carl e Lonn e a seguiu.

 Caminharam os dois pelas galerias recém-escavadas pelos gigantescos vermes, com apenas uma pequena esfera de luz branca os separando da escuridão completa. O córrego que Dalan havia caído antes corria veloz, fazendo o garoto crer que os monstros haviam achado um lençol subterrâneo em suas jornadas de acasalamento, que agora estava se expandido pelos túneis. De vez em quando um pequeno terremoto e um barulho surdo à distância indicavam que um verme estava perto, mas felizmente nenhum havia cruzado o caminho dos membros da Aurora, pelo menos até agora. O garoto olhou para baixo para evitar tropeçar em um sulco do chão, incomodado com o silêncio que já durava minutos sem fim.

 - Então... - Disse ele, com a voz rouca pela falta de uso. - O que você estava fazendo aqui?

 De início, Sasha não respondeu, nem sequer olhou para o companheiro. Algum tempo depois, ela quebrou seu próprio silêncio. - Havia uma missão na guilda para descobrir o esconderijo de uns contrabandistas de ronatto que ocupavam os túneis criados pelos vermes da montanha. O Tempo de Contrato e o pagamento pareciam agradáveis, então aceitei. E aqui estou, me metendo nos túneis dos monstros em busca de uma pista.

 - Não deveriam ser anões que supostamente deveriam cuidar dos assuntos do subterrâneo? - Perguntou o garoto. Estavam agora se aproximando da parede de rochas, visto que o córrego havia bloqueado todo o caminho com exceção de uma fina estrada grudada às extremidades do túnel. - Digo, supostamente toda essa área é jurisdição deles.

 - Não vou me meter nas políticas de cidades mistas, nem com o aparente desgaste nas relações das duas esferas de poder. - Rebateu Sasha, com a voz entediada. - Se os humanos acham que os anões são relaxados nesse assunto ou não, isso não faz parte de minha missão. Estou aqui apenas para caçar os contrabandistas.

 - Entendo. - Disse o garoto, percebendo que aquela era a hora para parar de falar. No entanto, como se tivesse repentinamente se lembrado de algo, a garota continuou:

 - Amanda deveria ter vindo à Vertreit para recrutar um novo membro para a Aurora. Ela te falou algo sobre isso? - Perguntou, com os olhos fixos à frente.

 - Ah. - Disse o garoto, pego de surpresa. - Foi justamente o que viemos fazer aqui no subterrâneo. Ela conseguiu recrutar um anão, chamado Wieder Henf. Ele foi raptado com ela, então tecnicamente estamos indo salvá-lo também.

 - Um anão? - Perguntou Sasha, se virando para o rapaz com os olhos estreitos de desconfiança. -  Eles não se juntam à guildas de outras raças. Especialmente em cidades sem anões, como Helleon. O que ele quer conosco?

 - E-eu acho que ele tem algum problema com o coletivismo anão. - Disse apressadamente Dalan, engolindo em seco. - Foi o que ele disse para mim.

 - Estranho... - Disse Sasha baixinho, encarando o chão. Um segundo depois, no entanto, ela voltou a se focar. - Vamos nos manter atentos à missão. - Disse para o outro, como se ele tivesse falado. - Enquanto eles tiverem reféns, dúvidas não irão nos ajudar em nada.

 - Entend... - Antes de completar a frase, Dalan sentiu o pé sendo puxado violentamente para trás, agarrado a algo viscoso e frio. Ele se desequilibrou e caiu com a boca no chão, mordendo a língua no processo. Antes mesmo de cuspir o sangue da boca, sofreu outro puxão, fazendo-o voar uma bela distância para trás.

 - Dalan! - Exclamou Sasha, jogando a lamparina para o lado e correndo em sua direção, mas o garoto estava imerso em seus próprios pensamentos, desacelerando o tempo ao redor. Deuses, por favor, rogou a quem pudesse ouvir enquanto era arrastado de cara virada para o chão, eu preciso de uma trégua. Viajei seis dias até chegar em Helleon, e depois lutei na guilda, corri atrás de um gato durante um dia inteiro, me embebedei, fiquei de ressaca, ajudei a carregar caixas, viajei mais algumas horas, corri de policiais, mergulhei em um rio, percorri horas em um subterrâneo e caí de uma altura que deveria ter me matado. Eu só peço que o quer que esteja me puxando seja um problema fácil de ser resolvido. Dalan terminou sua prece e girou o corpo, conseguindo encarar o que estava atrás dele. Certo, concluiu a si mesmo. Os deuses o odiavam.

 À sua frente, dezenas de seres parecidos com sapos de um metro de altura, com corpo laranja e uma faixa negra que percorria as costas e terminava entre os olhos, esticavam suas gigantescas línguas em sua direção. Dalan engoliu em seco, sem conseguir reagir, mas Sasha surgiu de fora de seu campo visou e puxou seu braço, arrastando-o para a direita e fazendo com que os golpes errassem o garoto por um triz. Ela caiu no movimento, rolando no chão alguns decímetros. Quando se levantou, estava com o rosto vermelho.

 - Você vai ficar aí se divertindo com esses Franges ou vai me ajudar? - Ralhou ela, limpando um pouco de sujeira do canto da boca. Como se tivesse acordado, o rapaz segurou a língua que continuava agarrada ao seu calcanhar, congelando o músculo. O Frange gritou, mergulhando de volta para a correnteza. No entanto, surgiram mais cinco para substituí-lo na missão de capturar os dois membros da Aurora.

 - O que eles querem? - Perguntou Dalan, rolando para trás para evitar um novo golpe. - O que são essas coisas? - Um Frange saltou em sua direção, mas um soco rápido o afastou.

 - São Franges. - Respondeu Sasha, se abaixando para evitar o contato de uma língua. - Sapos carnívoros que buscam presas na superfície. Eles não vão parar até que derrotemos todos. - Ela foi agarrada pelo pé, mas pisou de forma célere no chão, fazendo o membro se soltar.

 - Isso é possível? - Uma língua agarrou o braço de Dalan, mas ele rapidamente a congelou. - Eu acho que chamamos a atenção de todos os sapos da área! - Ele quebrou o músculo, e o Frange se afastou choramingando.

 - Não, você chamou a atenção. - Deixou claro Sasha, chutando um sapo que havia se posto entre ela e Dalan. - E eles não vão parar até que os derrotemos. Ou que outro alvo mais saboroso apareça para eles. - E como um passe de mágica, metade dos sapos viraram começaram a se afastar, pulando na água rasa na direção do caminho que Sasha e Dalan haviam percorrido. Sons de gritos surgiram de lá, e o restante dos Franges acompanhou o outro grupo, deixando os garotos parados, sem acreditar no que havia acontecido.

 - Você precisa me ensinar a fazer isso. - Disse um Dalan perplexo, tirando uma mecha de cabelo molhado da testa. - Sério, estou precisando de algo assim.

 - Fique quieto. - Ordenou Sasha, franzindo o cenho. - O que está acontecendo aqui? - Perguntou baixinho para si mesma. Sons de vozes ficaram cada vez mais altos, e ela mergulhou no chão molhado. - Se abaixe! - Dalan a acompanhou, sentindo a lama fria e pegajosa em cada pedaço de sua pele.

 - ... balditos. Todos eles, estou te dizendo. - A voz anasalada parecia pertencer a um dos bandidos que haviam sido deixados para trás, embora fosse difícil para Dalan identificar de qual dos dois era. - Nos abandonaram combletamente! - O garoto ouviu uma miríade de sons de chapinhar à distância, sumindo lentamente.

 - Fique calado. - Disse a voz do outro homem. - Se aquele garoto alcançar o esconderijo, estaremos ferrados de uma maneira que não consigo computar. - Um brilho fraco se destacou na escuridão, e Carl e Lonn entraram no campo visual dos dois. Eles seguravam um pano vermelho nas mãos, balançando-o com força no ar. Sasha enfiou a lamparina na lama escura, tentando diminuir sua luz. O outro garoto, por sua vez, se levantou para confrontar os raptores.

 - Não. - Disse baixinho Sasha, agarrando sua camisa quando ele passou próximo dela. - Eles podem ser úteis para nós. - Os contrabandistas continuaram discutindo um com o outro, e conforme se aproximavam dos membros da Aurora, um cheiro doce e forte começava a impregnar o ar. Dalan assumiu que vinha dos panos vermelhos, mas era apenas um chute. Esperaram Carl e Lonn seguirem adiante até se chegarem perto da parede de rochas. - Me acompanhe e fique calado. - Sibilou a garota. - Não faça nada que eu não fizer primeiro.

 Os dois saíram de seu esconderijo de sombras, caminhando cuidadosamente atrás dos ladrões que continuavam discutindo alto demais para perceber os membros da Aurora os seguindo. Agora estavam colados na parede, e um deles passava a mão pela superfície rochosa enquanto gesticulava com a outra. Dalan estranhou, mas alguns segundos depois os raptores se viraram como se fossem entrar nas rochas, e Sasha se adiantou.

 - Agora! - Sibilou ela, correndo para frente. Sua velocidade avançada a impeliu de forma desajeitada para frente, trombando com Carl e Lonn. Os três caíram na rocha, embolados, e o outro rapaz se apressou para confrontá-los.

 - Mas o quê-- Começou a gritar o homem de olhos puxados, mas Dalan se adiantou e lhe deu um chute desesperado no rosto, fazendo-o desmaiar. Sasha se arrastou para ficar em cima do outro contrabandista, que ainda estava estupefato, e o socou velozmente até que ele também perdesse a consciência. Os dois garotos da Aurora se levantaram em seguida, arfando continuamente. Dalan sentiu uma pontada nas costelas, e se apoiou nos joelhos para aliviar a dor.

 - Acho que agora eles não vão acordar tão cedo. - Conseguiu dizer depois de um tempo, mas quando se levantou Sasha já havia buscado a lamparina e agora estava inspecionando a área que os contrabandistas haviam se aproximado. Quando o garoto chegou mais perto, percebeu um corredor escavado por ferramentas, adentrando o leito das rochas. A luz branca iluminava as paredes úmidas, que exalavam o mesmo cheiro doce que Dalan havia captado antes.

 - Agora entendi. - Disse ela com a voz baixa. - Eles forraram o interior de seus próprios túneis com muco de vermes da montanha machos. As fêmeas se afastam pois não estão interessadas em acasalar tão longe da cordilheira de Tina, e os outros machos pouco poderiam se importar com os adversários. Isso afasta até mesmo os Franges, e eles têm um suprimento contínuo nos túneis recém-formados pelos monstros. - A garota afastou um pouco a cabeça, admirando o projeto. - Engenhoso.

 - Hm. - Dalan colocou a mão no nariz, se sentindo tonto. Era claro que seu pesadelo ainda não havia terminado. Ainda tinha alguns níveis de inferno. Sasha recomeçou a andar, percorrendo rapidamente a galeria.

 - Se quiser ficar aí, vai ser melhor para mim. - Disse ela sem se virar. O garoto deu uma leve fungada para aspirar o ar, e quase vomitou com o cheiro. Por um instante considerou a proposta de Sasha, mas se lembrou de Amanda e Wieder, ainda reféns. Não poderia simplesmente abandoná-los, e mesmo se fosse tão insensível a ponto de ficar ali, ainda teria dois contrabandistas que provavelmente ficariam irritados com ele. De todas as formas, só havia um caminho a seguir.

 Seguiu em frente, com Sasha iluminando o caminho.

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