sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

A Chuva e o Sol - Especial Fim do Mundo

BEM-VINDOS, SENHORAS E SENHORES, A MAIS UM POST DO RECINTO NERD!

E HOJE É O FIM DO MUNDO!



Eu escrevi essa crônica por causa de um livro colaborativo, e é claro que não ganhei. Só que eu agarantcho que é uma boa história! E chega de pontos de exclamação.

A Chuva e o Sol

Cinquenta e sete minutos.

Eu já estava parado em frente ao computador faz um tempo. 

Que e-mail imbecil. Fim do mundo? Quem é que acredita nisso hoje em dia? Parece que as pessoas precisam acreditar no apocalipse. Como dizem, o fim do mundo é pop. 

Cinquenta e seis minutos. 

Fico imaginando. Depois de 2012, qual será a data profética da moda? Qual será a data que as civilizações milenares escolheram? Qual será o ano que Nostradamus disse que o mundo ia acabar? Mas eu não vou cair nessa, não senhor. Pode anotar isso, ou meu nome não é Júlio. 

Cinquenta e cinco minutos.

Levantei para beber uma água. Esse tipo de coisa me deixa estressado. Quantas vezes ouvi que o fim dos tempos estava chegando? Sobrevivi ao Rock in Rio. Sobrevivi a 1999. Óbvio que vou sobreviver a 2012.

Cinquenta e dois minutos.

Meus pensamentos focaram no Natal. Novamente, ia passar essa data sozinho. Assim como os últimos três anos. Mas não me importava mais. Já estava acostumado. Meus pais morreram faz cinco anos, e terminei com minha namorada faz quatro. Eu não a amava. Aliás, não me lembro de ter amado ninguém na minha vida. 

Cinquenta minutos. 

Voltei ao computador. O e-mail me encarou quando me sentei. Quem é o idiota que fica mandando essas mensagens? Não tem nada melhor a fazer? Deve ser um desses pivetes que acham que são donos do mundo. Chequei o e-mail novamente. Ele veio de uma firma de construções que eu era cliente faz uns anos... cujo escritório estava a uns dez minutos da minha casa. Tentei voltar aos meus afazeres, mas o e-mail continuava lá.

Quarenta e oito minutos.

Chega. Hora de ter uma conversa com esse engraçadinho. Quem ele pensa que é? Isso não vai acabar assim. Me levantei do computador e fui em direção ao elevador.

Quarenta e seis minutos. 

Droga de elevador. Droga de família que atrasa os outros. Será que eles não tem consideração pelas outras pessoas? Acham que são os donos do mundo. Bem, talvez o fim dos tempos devesse chegar para eles. Comecei a andar mais rápido. O babaca do e-mail ia ver. Ele ia ouvir muito. Quem é que faz essas brincadeiras e acha engraçado? 

Quarenta minutos. 

Até que não demorei tanto. No entanto, havia um problema. O prédio tinha um porteiro eletrônico. Droga. Queria chegar de surpresa no escritório. Mas que se dane. Disquei o número.

- Alô? - Disse uma voz feminina. Um pouco trêmula, mas eu não tinha me importado com isso na hora. 

- É você que fica mandando e-mails sem graça para outras pessoas?

- Aposto que ela não esperava por isso. Quem fica aprontando brincadeiras de mau gosto nunca espera retorno. 

- Q-Quem é você? Você recebeu o e-mail? 

- Claro que recebi o e-mail, cacete! Eu vim aqui tirar satisfação! Abre esse portão para termos uma conversa, sua babaca!

A voz ficou em silêncio.

Trinta e oito minutos.

O portão abriu. Hora do show.

 rinta e sete minutos. No elevador, fiquei pensando. Não esperava que fosse uma mulher. Achava que seria um pivete que se achava a última bolacha do pacote. Nem pra isso essa vaca fez as coisas direito. 

Trinta e seis minutos.

Toquei a campainha. Já estava preparado para gritar, quando a porta se abriu e eu fiquei paralisado. A mulher que abriu a porta era jovem, de uns 25 anos, talvez, e tinha longos cabelos negros, que chegavam até a cintura. Aliás, uma bela cintura. E belos quadris, descendo um pouco mais a visão. Ela vestia uma camisa social branca e uma saia escura, que descia até os calcanhares. De fato, tinha um belo corpo. Voltei a visão para o rosto. Ela tinha lábios pequenos, assim como seu nariz, um pouco arrebitado. Mas foram os seus olhos que me paralisaram. Eram olhos grandes, de um verde incrível. E, sob os olhos, havia maquiagem borrada. Ela estava chorando.

- Então? Não vai fazer nada, valentão? Vamos, grite comigo! Anda! Eu mereço, faça alguma coisa!

- Disse ela, me encarando com aqueles olhos verdes. Malditos olhos verdes.

- E-eu... - Excelente. Que modo de lidar com as situações, Júlio. Você não ia gritar com ela? Pois bem, faça como a moça disse. - Veja bem, você... - Eu não conseguia. Na minha mente, ela tentaria dar uma de esperta para cima de mim. Não ficaria omissa, esperando o esporro. Ela me fitou por mais uns segundos, e voltou para o escritório, fechando a porta com um estrondo arrebatador. Depois do trovão que a porta fez, o silêncio. E soluços do outro lado dela. 

Trinta e cinco minutos.

Abri lentamente a porta. Ela estava sentada no sofá, com o rosto nas mãos. Sentei-me ao lado dela. 

- O que você quer, afinal? - Começou ela, com a voz abafada pelas mãos que cobriam a face. 

- Foi... foi você que enviou o e-mail? 

- Sim. Eu recebi de uma outra pessoa, e precisava passar para alguém. Seu e-mail estava no cadastro, acho. Apenas digitei umas letras aleatórias e o computador me mostrou seu e-mail. - Ela tirou as mãos do rosto e olhou para mim. - Me desculpe. Juro que não queria fazer mal, apenas... apenas precisava... fazer alguma coisa. - Ela voltou a afundar o rosto nas palmas das mãos. 

- Você acredita no fim do mundo? 

- Como eu não poderia? Você leu o mesmo que eu. Eu não sabia o que acreditar agora. Continuava achando uma baboseira, mas a ideia ia penetrando lentamente no meu cérebro. O fim dos tempos...

Trinta e três minutos. 

- Sabe... eu nunca fiz nada de útil na minha vida. - Ela tirou novamente o rosto das mãos e passou a fitar a tela do computador, como se todas a sua vida estivesse passando pelo monitor. - Nunca me apaixonei... nunca fiz nada de especial. Só estudei, passei na faculdade, e parei aqui. Meus pais sempre me deram tudo que eu precisava, nunca lutei por nada. Nunca dei valor a nada. Gastei minha vida à toa.

Nós dois ficamos quietos. Incrível como, revendo toda a minha vida, eu também nunca fiz nada de especial. Namorei sem amar. O mundo não me conhecia. 

Trinta minutos. 

Não. Deve haver algo. Algo que faça com que minha vida tenha sentido. Algo que mostre que minha existência mudou o mundo de algum jeito. Comecei a repensar toda a minha vida. Em algum lugar, em algum momento, eu devo ter feito algo. Algo especial. Algo significativo. Não posso ter gastado minha vida à toa.

Vinte e seis minutos.

A luz do fadado mundo lá fora banhava palidamente a sala. A luz do sol. O sol. É isso. Sempre me senti bem com o sol. Não tenho como explicar, apenas gosto dele. Seu calor, seu início, seu fim. Talvez ele me dê as respostas. Talvez seja tudo que eu preciso.

- Qual é o seu nome mesmo? - Disse enquanto me levantava do sofá. 

- Sophia. - Ela olhou para mim. - O que está fazendo?

- Sou o Júlio. Venha. Tenho uma ideia. Vamos ver o sol. 

- O quê? 

- Olha, eu não sei como explicar, mas venha comigo, por favor. Eu preciso ver o sol. Ele sempre me fez sentir bem. E é tudo que eu quero agora. Talvez eu encontre um significado para nossas vidas, não sei. Mas eu preciso tentar. 

- Mas...

- Venha logo, por favor! - Supliquei. Ela olhou para mim, com um ar de piedade nos olhos. Então me acompanhou. Entramos no elevador e fomos direto ao terraço. Precisava de uma visão clara do céu. Precisava do sol. Por favor, me dê respostas. 

Vinte e quatro minutos. 

As gotas pingavam no meu nariz.

- Eu... sinto muito. - Ela disse, se aproximando de mim. - Sei que no início não dá pra perceber de dentro do escritório se está chovendo ou não, mas eu já estou lá faz alguns anos. Sabia que estava chovendo. Sinto muito. 

- He... hehe... heheha... hahaa... HAHAHA! - Desatei a rir como um maníaco. Sophia não me acompanhou, ficando apenas olhando para mim. Como ela não estava vendo a graça na situação? Eu coloquei todas as minhas esperanças em algo que eu não tinha controle nenhum. Eu devo ser um idiota mesmo. 

Um idiota que vai morrer.

Meu Deus, eu vou morrer. 

Não percebi que tinha caído de joelhos. Não percebi as lágrimas no meu rosto, confundidas com a chuva que caía incessantemente. Eu ia morrer. Nunca fiz nada de especial, gastei toda a minha existência.

Entrei em desespero.

Vinte e dois minutos.

Gastei minha passagem na Terra. Eu vou morrer. 

Vinte minutos.

É isso? É assim que tudo acaba? Apenas mais um a viver, um entre sete bilhões que iriam encontrar seu fim?  

Dezoito minutos. 

Patético. Eu sou patético.

Quatorze minutos.

Eu vou morrer.

Doze minutos. 

Nunca fui um homem da Igreja. Não me lembro da última vez que rezei. Mas Deus, por favor, me dê uma luz. Me mostre que minha vida não foi em vão. Por favor. Por favor, me dê um sinal.

Dez minutos.

De repente, a luz. Parou de chover. O sol se abria em um pequeno espaço naquele mar de nuves, que se fastavam. É um belo jeito de morrer, não? No mínimo eu morro com o sol. O Sol.

Sentia como se houvesse um pensamento querendo ser notado. Como se houvesse um baú, e ele estivesse gritando para sair de lá. Hora de abrir o baú. 

Quatro minutos. 

É isso. Olhei para Sophia. Não percebi que ela ainda estava do meu lado, abraçada ao meu braço e fitando o chão.

É agora. É hora do tudo ou nada. 

- Sophia? - Disse, fazendo-a levantar.

- O quê? - Ela respondeu, com uma fisionomia derrotista. Precisava salvá-la. Precisava que ela visse o mesmo do que eu. 

- Veja, acho que... vi um sentido em nossas vidas.

- O quê? Como assim?

- Encontrei um sentido em nossas vidas. Algo de especial. 

- Mas eu já disse, nada ocorreu comigo. Você não me conhece. Não sabe o que aconteceu comigo. Acredite, eu apenas existi. Não vivi. 

- Isso é estúpido. Até pouco tempo atrás eu também acreditava nisso, mas veja! Não importa o que tenhamos feito, não importa se mudamos a forma de pensar do planeta ou apenas passamos na faculdade. Nossas vidas, todas as vidas, tiveram algo de especial, algo que tenha feito tudo valer a pena.

- Você está maluco.

Três minutos. 

- Não! Você apenas está tentando pensar em coisas grandes. Pensando que apenas vidas como a de Gandhi ou a de Einstein valeram a pena. Pense em coisas pequenas. Pense em pequenas conquistas. Ter visto seu time ser campeão, ter beijado pela primeira vez, ter passado um segundo, que seja, com a pessoa especial ao seu lado. São esses momentos que nos fazem sentir vivos, pequenos momentos. O que importa é o que compartilhamos. 

- Ainda não entendo. 

- Veja! Há um momento em que você se sentiu feliz? Um momento que tocou a vida de outra pessoa? Pois são esses momentos que fazem a vida valer a pena! Esses pequenos momentos, que juntos se tornam algo muito maior do que tudo. Não importa o mundo, que se dane o mundo e o fim dele. O que importa são as outras pessoas. O mundo delas. Se passamos um momento especial com elas, por menor que seja, vale a pena. Pare de pensar em termos gigantescos, quase impossíveis de se realizar. Pense nas pequenas coisas, no aqui e agora. E o que eu quero no aqui e agora é que você entenda o que estou tentando passar. Pois nesse momento, você é o único mundo que importa para mim. Eu nunca amei, e não sei descrever o sentimento. Talvez o que eu sinta não seja amor. No entanto, saiba, que nada agora é mais importante para mim do que você. Eu preciso que você entenda. É o único mundo que eu quero mudar.

Ela ficou em silêncio.

Quase podia ver as engrenagens girarem atrás da testa dela. 

Dois minutos. 

Silêncio.

Um minuto.

De repente, eu vi compreensão nos olhos dela. Ela sorriu. Foi apenas um relance, pois em seguida eu só estava pensando em como os lábios dela eram macios.

Cinquenta segundos.

Um abraço. Um abraço tão apertado, quase parecíamos um. Sua língua era doce.

Quarenta segundos. Minhas mãos passavam pelos seus cabelos. 

Trinta segundos. Paramos para nos encarar. Seus olhos verdes. Continuamos o beijo.

Quinze segundos.

Como ela era linda. 

Meu Deus, como ela era linda. 

Zero.

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